Apesar de ser parte essencial do tratamento de milhões de brasileiros com diabetes, a aplicação de insulina ainda gera dúvidas e muitos erros que impactam diretamente no controle glicêmico. Desde o tipo da agulha até a forma de segurar a pele, cada detalhe importa. Com o tempo, falhas na técnica podem levar a complicações como hipoglicemias, dor na aplicação e até alteração na absorção da insulina.
Para esclarecer os principais pontos e ensinar o passo a passo correto, o portal “Um Diabético” conversou com Gisele Filgueiras, enfermeira e educadora em diabetes, que reforça: “A forma como você aplica faz toda a diferença no tratamento”.
O lugar certo de aplicação da insulina faz diferença
A profissional começa explicando o que parece simples, mas muitos fazem errado: a prega cutânea.
“Está no espaço mais ou menos de dois dedos, tá? A gente vai pegar o nosso polegar e o nosso terceiro dedo. E a gente vai fazer uma leve compressão. Não é pra fazer isso e nem com profundidade. É uma leve compressão. Só pra subir um pouquinho”, orienta.
Fazer a prega do jeito certo garante que a insulina vá para o tecido subcutâneo, evitando que atinja o músculo, o que pode causar picos de hipoglicemia.
Além disso, nem toda agulha precisa da prega cutânea. “Agulhas de 4 e 5 mm, eu não faço prega. Porque ela é tão pequenininha que chega no tecido subcutâneo com segurança”, afirma Gisele, enquanto mostra uma das agulhas de menor tamanho. Esse tipo de agulha pode ser usado com segurança por qualquer pessoa, inclusive adultos com baixo índice de massa corporal (IMC).
Qual tamanho de agulha usar para aplicação de insulina?
De acordo com o Guia da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), os tamanhos de agulha mais comuns variam de 4 a 12 mm. Porém, agulhas acima de 8 mm oferecem maior risco de alcançar o músculo, o que deve ser evitado a todo custo. Nesse caso, o recomendado é aplicar em um ângulo de 45 graus e sempre com prega cutânea, mesmo em adultos.
As agulhas de 4 e 5 mm são consideradas seguras e eficazes tanto para adultos quanto para crianças. Já as de 6 mm exigem mais atenção: para adultos, o ideal é usar em 90º com prega; em crianças e adolescentes, o ângulo precisa ser reduzido para 45º. No caso das agulhas de 8 mm, a recomendação é usá-las apenas em adultos, e com cautela em pessoas magras ou com pouco tecido subcutâneo.
Passo a passo: como aplicar da maneira correta
Aplicar insulina é mais do que simplesmente “espetar” e injetar. É preciso seguir uma sequência de cuidados. Antes de tudo, lave bem as mãos. Em seguida, escolha e limpe com álcool 70% o local de aplicação. Geralmente, o abdômen, a parte posterior dos braços ou a coxa. Espere secar o álcool antes de seguir.
Se for usar seringa, prepare o material com calma. Para um tipo de insulina, você deve aspirar o ar equivalente à dose antes de puxar o líquido. Se for misturar dois tipos (como NPH e Regular), a ordem de aspiração também importa: insulina Regular primeiro, depois a NPH. Isso evita contaminação entre os frascos.
Na hora de aplicar, faça a prega cutânea se necessário, introduza a agulha com um movimento rápido e firme e injete de forma contínua — mas não apressada. Mantenha a agulha no tecido subcutâneo por alguns segundos antes de retirar. Isso evita que a insulina vaze ou retorne pela agulha.
Caneta ou seringa: o que escolher?
A escolha entre caneta e seringa depende da dose e da necessidade de precisão. Crianças e pacientes com doses muito baixas devem preferir as canetas que permitem ajuste de 0,5 unidade. Já as seringas de 30 unidafes ou 50 unidades, também graduadas em frações, ajudam a garantir maior exatidão na dosagem.
Por mais prática que pareça, a reutilização de agulhas não é indicada.
“Além do risco de infecção, aumenta muito a chance de lipodistrofia. Uma alteração no tecido subcutâneo que atrapalha a absorção da insulina”, alerta Gisele.
O descarte também merece atenção: o ideal é usar coletores específicos. Quando não disponíveis, pode-se usar frascos rígidos, como os de água sanitária, desde que estejam bem vedados.
Atenção com os locais e com a pele
É essencial sempre variar o local das aplicações para evitar a lipohipertrofia, o famoso “caroço” de tanto aplicar no mesmo lugar. Esse tecido endurecido prejudica a absorção da insulina, o que pode gerar descontrole glicêmico. Além disso, segundo a SBD, nunca se deve aplicar insulina em áreas com alterações na pele.
A agulha deve entrar em um ângulo certo e, depois, é preciso pressionar suavemente o local da aplicação por alguns segundos, apenas se houver sangramento.
Aplicar bem é tratar melhor
A aplicação correta da insulina é um passo fundamental no controle do diabetes. Técnicas erradas geram dor, descontrole glicêmico e até risco de internações. Por isso, profissionais de saúde devem estar preparados para ensinar, corrigir e acompanhar a técnica dos pacientes.
“O erro na aplicação interfere diretamente no tratamento. E tem muita gente fazendo errado há anos sem saber”, alerta Gisele. A boa notícia é que, ao corrigir esses erros, o efeito é imediato: a insulina começa a funcionar melhor e o controle da glicose melhora, o que pode reduzir até a dose necessária.
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