Repórter e editor do portal Um Diabético. Escreve sobre saúde desde os tempos da faculdade de jornalismo. Para sugerir uma reportagem: redacao@umdiabetico.com.br
A história é real mas o nome dos personagens foram trocados a pedido da Dona Ivone, hoje com 68 anos de idade. Aos 27 anos ela era professora de uma escola infantil, em Itapetininga, interior de São Paulo. Numa reunião conheceu o também professor Geraldo, três anos mais velho. Os dois se apaixonaram. O ano era 1982 e o casal seguiu a tradição à risca: primeiro o namoro, depois o noivado… daí chegaram a marcar a data do casamento. Mas Ivone começou a emagrecer rapidamente, percebeu que tinha muita sede. Um dos exames pré-nupciais detectou o diabetes.
A professora viu o plano do casamento mudar, contra a vontade dela. Geraldo a deixou. “Houve pressão da família, eu cheguei a ouvir uma pessoa dizer que o Geraldo se separou de mim porque eu nunca poderia dar um filho a ele”, lembra Ivone.
Durante muitos anos o diabetes foi considerado uma sentença de infertilidade. Mas com o avanço das pesquisas já se sabe que isso não é uma regra. Também é fato que a gravidez da mulher com diabetes é mais difícil, mas não impossível. “É sabido que a diabetes está relacionada ao aparecimento de várias doenças, condições e complicações, mas poucos sabem sobre sua associação com a infertilidade”, explica a ginecologista e obstetra Stephanie Majer, especialista em reprodução assistida.
Antes de tentar
A mulher que já tem o diagnóstico deve fazer uma avaliação com o obstetra e o endocrinologista antes de engravidar. Esses especialistas vão investigar outras doenças associadas ou lesões em órgãos-alvo e possíveis complicações. Antes de iniciar qualquer tratamento de fertilidade, é essencial garantir que o diabetes esteja sob controle, pois isso pode aumentar as chances de concepção e uma gestação saudável.
A especialista em reprodução humana sugere que esse acompanhamento siga durante toda a gestação.
O nascimento do Cauã
Érica Turon de Oliveira, psicóloga de 38 anos de idade, viveu tudo isso até a chegada do Cauã, atualmente com 2 anos de idade. O planejamento da gravidez começou em 2020. “Em outubro, depois de muitas hipoglicemias recorrentes fiz um exame de farmácia que deu positivo. No mesmo momento, comprei o sensor para acompanhar a glicemia até ter todas as orientações médicas de obstetra e endócrino”, lembra Érica, que tem diabetes tipo 1 desde os 21 anos. “Ajustávamos as doses de insulina semanalmente, com base em uma tabela que eu preenchia com as glicemias diárias (eram mais de 10 medidas). Minha resistência a insulina pela manhã foi muito forte, sempre com picos acima de 280. Chegava no almoço com hipo. Depois ficava bem até o jantar e nas madrugadas eram uma loucura, hipos ou hiper severas”.
No quarto mês de gravidez o descontrole aumentou: “fui internada para acompanhar e entender melhor essas resistências. Chorei muito na sala da endócrino, me senti fracassada em não conseguir controlar meu corpo. Ela me acolheu com tamanho carinho e disse ‘quando nasce um bebê, nasce uma culpa’. Era o que eu sentia… a cada hipoglicemia severa, ou hiperglicemia demorada, eu coloca a mão na barriga e pedia perdão ao Cauã, por fazê-lo passar por tudo aquilo”, conta emocionada.
Ela teve alta e seguiu fazendo ultra-sons fora da maternidade. “Era sempre uma tensão. Ficávamos apreensivos com a formação do bebê e tudo o mais que toda mamãe e papai sentem nesse período”. A médica Stephanie Majer aponta quais complicações fetais são mais comuns. “Malformações, principalmente cardíaca, macrossomia, prematuridade, hipoglicemia neonatal e hipóxia, uma condição em que não chega oxigênio suficiente às células e tecidos do corpo”, destaca a especialista. As complicações em relação às gestantes são: hipertensão gestacional, trabalho de parto prematuro e aumento do líquido amniótico.
Nova internação
A gravidez de Érica avançava e o controle da glicemia seguia difícil. Numa consulta médica pediu para ser internada. A médica já estava com a papelada pronta: “No hospital escutavam o coração do Cauã a cada três horas. E as glicemias também eram medidas com bastante frequência. Ainda com todos os cuidados, não conseguimos melhorar”. O parto precisou ser antecipado. Ocorreu no dia em que a gestação alcançou 37 semanas. “Eu já estava internada há quinze dias e isso seriam dali mais 4 dias. Fiz as lembrancinhas muito emotiva e com medo, eu sabia que meu bebê teria que ir direto para a UTI, mas meu coração estava feliz e ansiosa para que tudo acontecesse rápido”, relembra.
Cauã nasceu com quase 4 quilos. O peso tem relação com o diabetes da mãe. O bebezão ficou internada na UTI Neonatal apenas para acompanhamento “A pediatra quis acompanhar o desenvolvimento do Cauã no primeiro ano de vida. Com todos os estímulos, todos os marcos do Cauã foram normais… rolou, sentou, andou tudo dentro do esperado”, comemora a mãe, orgulhosa: “Ele nunca teve uma hipoglicemia! Ele é, na verdade, o bebê mais sorridente que já vi! A gestação foi complicada, tensa, cheia de restrições, muitas picadas (mais de 10 por dia), mas o Cauã foi o bebê mais amado e esperado. Sentíamos amor e cuidado vindo de todos os lados! Fomos abençoados a todo o tempo é só temos a agradecer por essa vida tão linda e vitoriosa do Cauã”, conclui Érica.
Opções de tratamento para fertilidade em mulheres com diabetes:
Medicamentos para estimulação ovariana: Medicamentos como o citrato de clomifeno podem ser prescritos para estimular a ovulação e aumentar as chances de concepção.
Reprodução assistida: A fertilização in vitro (FIV) é uma opção para mulheres com diabetes que enfrentam desafios de fertilidade. Nesse procedimento, os óvulos são coletados e fertilizados em laboratório antes de serem implantados no útero.
Cirurgia para correção de problemas ginecológicos: Em alguns casos, a cirurgia pode ser recomendada para corrigir problemas ginecológicos que podem estar afetando a fertilidade, como a remoção de pólipos ou a correção de problemas uterinos.
Consulta com especialistas: Mulheres com diabetes que estão tentando engravidar devem procurar um médico especialista em reprodução humana ou um endocrinologista reprodutivo para orientações específicas e um plano de tratamento personalizado.
Maneiras de se manter saudável durante a gestação:
Substitua carboidratos refinados como pão branco, doces e refrigerantes por opções integrais que são ricas em fibras, como pão integral, frutas e verduras.
Em vez de três grandes refeições por dia, opte por pequenas refeições ou lanches com carboidratos reduzidos, entre duas e quatro horas, de acordo com a recomendação do médico e/ou do nutricionista.
Incluir atividade física regular antes e durante a gravidez é o recomendado, se possível sob orientação profissional exceto naquelas em que houver contraindicação obstétrica.
Em geral, os níveis glicêmicos devem ser medidos após cada refeição, mas o médico pode aconselhar também a realização de testes no início da manhã e antes das refeições.
Mulheres com diabetes gestacional têm maior possibilidade (60%) de desenvolver o diabetes tipo 2 em um momento posterior da vida. Por isso, é importante realizar check-ups regulares.
Fonte: Stephanie Majer, ginecologista e obstetra especialista em reprodução assistida